Noite de insetos, cigarros, cerveja. Noite sem homens, mulheres segredadas como todas hão de ser. Era hora de jogar. Era hora de despir-se e no entanto permanecerem intactas em supostos absurdos não compartilhados. Todas pensavam o mesmo e naturalmente se pensavam únicas. Uma queria, outra tinha, a terceira ainda escolhia. Absolutamente clandestinas quanto a eles, que sonhavam com uma mocinha da tevê, ou dormiam com amigas. Noite sem homens; um deitou-se, o outro era espera, do terceiro não se sabia. Afinal, um espaço fora delimitado e abriam-se todas as frágeis cercas que dão para dentro? Só enxergamos o fim quando corremos à procura de umas cores alegres e acidentalmente chegamos lá, vemos o que sempre soubemos certo, sempre soubemos o que todos sabem. E o que vai além? Em mim são poços, são mortos, morto-vivos, lágrimas contidas em lagos inertes; no meu limite infinito é luz, mas uma luz de desordem e miséria. Uma luz desconforto, quase sem luz, jamais sem. Em mim são homens que ainda não formaram rosto, mulheres que me pediram o aspecto e lhes dei de bom grado. No meu terreno proibido e nunca habitado eu estou nua, nua e frígida. Suave nos contornos e na voz. Todos despidos; pessoas que ainda não conheço, assombrações, os defuntos que velo religiosamente e não são absolutamente enterrados (nem nunca serão). Meus dedos nus de toque e de aproximação, faltam anéis, compromissos, faltam mãos que não sejam as minhas, são dedos roídos. Estamos desprotegidos, eu e meus dedos e meus vivos e meus mortos. O vento nos espanta, e nesses dias de vento e binóculos fora da teia, nos juntamos. Eles se escondem num compartimento interditado, apertam-se, calam-se e permanecem até que eu abra as portas e novamente os liberte. Noite de insetos, cigarros, cerveja. Estão todos presos, amordaçados pelo jogo de mulheres que tiram uma peça de roupa, permitem beijos catalogados, talvez leves arrepios não planejados, nada que comprometa seriamente, que as deixe sem ar despudoradas animalescas maravilhosamente instintivas e sorridentes. Negam-se a mostrar o sexo, as ancas, cobrem os seios ou qualquer sinal que as deixe vulneráveis, permanecem intactas.
segunda-feira, 21 de abril de 2008
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Venda(val)
Sabe que irei, no entanto me atrai maquinalmente. No entanto tira as vestes, me cobre de laços inofensivos e apertados - convergentes a ela. Usa as cobertas, se esconde, me expõe até que eu implore de desejo. Acovarda-se nos dias de fúria, de despedida, vontade prestes a destruir o que pouco resta. Chora até que eu desista. Ordena que eu saia e no entanto nós górdios colocam-se frente à porta. Ela os coloca. Desloco-me à medida que dorme ou temporariamente ausenta-se. Deixo-lhe e me deixo. Fujo e não aproveito. As moças todas me parecem iguais. Iguais em seu cabelo azul. Iguais nas roupas excessivamente coloridas de uma vida. Todas me parecem idênticas às suas medidas desproporcionais e às unhas nervosamente roídas. Não fosse pelo rosto, não fosse pela falta de rosto. Não vejo olhos cinza, não vejo seu nariz com uma inútil pedrinha brilhante, nem sua boca castigada pelo frio. As outras são pele uniforme. Contornam meus desejos e recusam se mostrar. Volto pela aflição. Nossa poeira, geladeira vazia, móveis que ela trouxe, cama há semanas desforrada. E ela perdida na janela que não dá para paisagem alguma.
Como de costume volto, espero que me retire a venda, desate as mãos e mais uma vez recolha meu coração para si.
Como de costume volto, espero que me retire a venda, desate as mãos e mais uma vez recolha meu coração para si.
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